sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Gauchês X Paulistês - 2º Round

Continua breve levantamento idiomático entre o português que se fala aqui e o português que se fala lá:
Vazio (carne) - Fraldinha
Meu bruxo - Meu grande amigo
Treno - Treino
Bolicho - Risca-faca
Índio - Baiano
Negrinho - Brigadeiro
Lomba - Ladeira
Ceva - Breja (ou Birra)
Qualquer coisa, prenda o grito - Qualquer coisa, me avise

quinta-feira, 5 de julho de 2007

Las Vegas é aqui!

Las Vegas é aqui! Tenho certeza disso. Não tem nenhum casino legalizado, só uns tantos bingos e nada tão majestoso(brega) quanto uns em SP. Lembro de um na 23 de Maio, quase chegando ao Obelisco, que tem umas estátuas africanas. Coisa de muito bom gosto pra quem não entendeu a ironia do www.voteborba.com.br.

Enfim, tudo isso pra dizer que, se a lei da oferta e da procura se aplicar a todo e qualque tipo de negócio, então Porto Alegre é a cidade mais falida do Brasil. O que mais tem por aqui (e o meu aqui continua sendo o Centro da cidade) é oferta de crédito fácil, com juros baixos e sem burocracia.

Tem Finasa, Credifácil, Ibi, Taií e uma outra infinidade de marcas. Basicamente cada loja tem seu próprio sistema de agiotagem pseudolegalizada. As promotoras da maioria usam roupas coloridas e distribuem panfletos sem muita vontade. Tarefa difícil prometer a tal trinca: grana na hora, sem (muitos) juros e burocracia.

Mas a minha quadrilha predileta é uma que ronda a porta da 8ª Circunscrição do Exército, na Andradas (sempre ela). O prédio tem uma agência bancária da Caixa (ah! a Caixa...) que paga aos pensionistas da nossa última salvaguarda nacional, o Exército Brasileiro, a Elite do Combate Convencional.

Mas uma porcada não justifica a outra. E digo, é de enojar o jeito com que aqueles pulhas - em ternos mais cortados, sapatos mais formados e exibindo uma gravidade que não lhes convêm - tentam empurar crédito a viúvas de sargentos reformados que tiram nos duzentos e poucos reais o sustento do mês.

Comunicam-se entre si com olhares, sinais, e ficam espalhados pela quadra toda, cercando as futuras vítimas. Sim, é chavão, mas é como urubu na carniça. Mas mosca na merda seria mais adequado.

sábado, 23 de junho de 2007

Gauchês X Paulistês - 1º Round

Segue breve levantamento idiomático entre o português que se fala aqui e o português que se fala lá:

Afudê - Ducarai
Bah - Putz
Baaaaah - Puta merda

Cacetinho - Pãozinho (é o que dizem, me recuso a testar)
Merece - De nada
Meu galo - Meu truta
Pelotas - Campinas
Pinta - Mina
Salsichão - Lingüíça (a de churrasco)

Sinaleira - Sinal
Sou parceiro - Tô dentro
Surdina - Escapamento
Tchê - Aê

sexta-feira, 22 de junho de 2007

A capital da bola

A quarta-feira tinha algo de diferente no ar. A começar pela temperatura. O dia rompeu uma semana de frio e repentinamente os termômetros da cidade marcavam 30ºC. Seria esse o perfume da esperança? Não. Era mais que isso. Quase uma certeza de que o Grêmio faria quatro gols e ficaria com o título da Libertadores.

Porto Alegre fervilhava. Mais que a Av. Paulista que eu vi minutos antes do Brasil bater a Alemanha e se sagrar pentacampeão. E não era esperança que movia os tricolores gaúchos. Era certeza da virada. E por que duvidar? Não era impossível ganhar o título da Série B no pertinente Estádio dos Aflitos? Não era impossível bater o Caxias e garantir vaga na final do Gaúchão 2007?

Mais que qualquer outra torcida que eu já vi, o Grêmio contagiou Porto Alegre de uma tal forma que até os agouros colorados eram tímidos. Nem seus principais rivais conseguiam se apoiar de forma convincente nos 3 a 0 que o Boca Juniors garantira uma semana antes em Buenos Aires.

Um milhão de camisas do imortal cobriram os peitos dos gremistas. No fim da tarde, vi uma fila se formar na catraca. Não a do Olímpico, mas a dos prédios de escritórios. Dezenas olhavam impacientemente para o relógio do marcador de ponto, esperando os intermináveis segundos que não permitiam a chegada das 18h. Chegou! Saíram dali e foram. Para o estádio, para os bares, suas casas.

Durante o jogo, silêncio mortal. Caminhando por diversos bares vi centenas de gremista vidrados na TV, um ou outro comentário e a narração uníssona de várias televisões promovendo surround exclusivo. Numa praça, um grupo puxou a fiação do poste de luz e ligou um pequeno televisor 14 polegadas.

O fim se aproxima. E um tal certo Juan Romám bateu o prego no caixão. Não deu. Mas era o Boca, dá pra entender. Os gritos que se seguiram eram colorados. Nada de escândalo. Alguns poucos fogos e mais silêncio, que logo virou mudez da madrugada. Tinha tudo pra ser lindo, mas não foi.

No dia seguinte, a torcida que foi elogiada - invejada até - por todos, errou. Guardou suas camisas, e a quinta-feira amanheceu novamente fria e mais vermelha que azul, preta e branca. Era hora de sangrar junto com o Grêmio.

Na quinta, eles estavam a pé, mas sem o escudo e as cores que juraram seguir sempre, onde quer que estivessem.

segunda-feira, 11 de junho de 2007

O presidente flanelinha

- Porto Alegre é terra de mancos e loucos. Isso quando não são os dois em um só.

Quem me disse a pérola foi meu irmão. Veio passar uns dias por aqui com minha cunhada. Não podia estar mais certo. É o que mais tem aqui pelo centro: mancos e loucos. Adicione aí uma pitada generosa de velhas de pele enrugada e verde e cabelo dourados: dondocas que se acham Dorian Gray. E esse é o centro.

Saquei isso logo que vim pra cá a primeira vez. Estava sentado numa praça que meses depois seria minha vizinha. Plena terça-feira chuvosa. Não era nem meio-dia e se aproxima um sujeito com pinta de quem tinha banda cover do ZZ Top. Vem se aproximando, conversando, sozinho.

- Opa, terias fogo, meu galo?

Respondi com a cabeça e saquei o isqueiro. O barbudo, sem se acanhar, vira-se para o lado - que continuava vazio - e solta:

- Pô, e não é que ele tem mesmo. Tu estavas certo.

Acendeu o cigarro agradeceu e se foi. Conversando com o vazio.

Passaram-se meses e eu já estava morando aqui. Voltando pela Andradas, ao lado da Casa de Cultura Mário Quintana. O local, o antigo Hotel Majestic, era do Paulo Roberto Falcão e acolheu - de graça - durante anos um já miserável Quintana. O térreo é ocupado por salas de cinema e alguns janelões foram preservados como murais para cartazes e recortes dos filmes em cartaz. Esses janelões são ligeiramente mais recuados na calçada. Ou seja, alguem que se enfie ali custa a ser visto.

Era tarde da noite e vi um vulto masculino enfiado. Logo pensei que o sujeito estivesse "fazendo mal" a alguma donzela desfrutável. Me aproximei sem dar muita bola e me virei para ver o que acontecia. O sujeito estava sozinho fazendo juras de amor e beijando o vidro da janela. E as declarações não saiam pastosas, embriagadas. Era tudo com muita convicção. Amor real.

Mas meu louco predileto é o presidente flanelinha. Apelidei ele assim porque é a cara do presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad, e cuida de carros. Não diz coisa com coisa, nunca. E sempre está falando sozinho. Às vezes me chama de senhor e me pede um cigarro. Não reclamo porque ele certamente não lê esse blog, por isso não sabe que odeio ser chamado de senhor.

O presidente mora no andaime de um esqueleto de uma casa colonial cuja fachada é o último vestigio de sua existência. Telhado, paredes, tudo se foi. A fachada está lá, na esquina da João Manoel com a 7 de Setembro. Embargada por alguma lei municipal que não permite demolições mas também não financia a reforma. Escala diariamente um tronco que escora o andaime.

Seu dircuso não tem nada de ideológico, mas critica e muito a classe dominante. Odeia ricaços que fazem pose mas são pedófilos. E tem nojo de dondocas que se fazem de boa esposa e dão para o jardineiro.

Dia desses estava sentado na soleira de uma porta e um Vectra pilotado por uma loira de seus 40 anos se preparou para sair. Ela abriu o vidro e estendeu a mão com algumas moedas. O presidente não se moveu. Só disse:

- Senhora, me desculpe mas não vou levantar. Estou com uma tremenda dor na bunda.


Horrizada, a mulher se foi. Olhei pra ele com uma cara de descrédito. O presidente flanelinha só riu e disse:

- Senhor, aquele cigarrinho?

Louco! Louco é o caralho.

sábado, 9 de junho de 2007

O trem

Não gosto da terceira pessoa. Mas por pura vergonha, uso-a agora. Quem escreve neste blog há de se desculpar pela demora na atualização. Baseando-me no longo hiato a que André Takeda, um jovem autor gaúcho, forçou seus leitores, me dei conta da irresponsabilidade que é deixar sem novidades aqueles que seguem suas escritas. Ainda que isso soe como uma tremenda arrogância.

E na vasta lista mental que tracei nesta pausa sobre futuros temas, me dei conta da injustiça de ter esquecido o Trensurb. Vou tentar corrigir o erro agora.

O Trensurb é uma linha férrea que sai do centro de Porto Alegre, rasga três cidades inteiras e vai terminar no coração de São Leopoldo. Em pleno Vale dos Sinos, acidente geográfico cortado pelo Rio dos Sinos - que leva esse nome por conta de sua sinuosidade.

É chamado por alguns muitos de metrô, mas para um paulistano trata-se de um trem de subúrbio. E é exatamente isso que ele é. Carrega diariamente milhares de pessoas vindo e indo a localidades da Grande Porto Alegre.

É também palco de algumas das cenas mais pitorescas que testemunhei nesse ano que passei por aqui. Como a noite de domingo em que vi um sujeito extremamente afetado, homossexual, sem dúvida - e juro, está é uma constatação isenta de preconceito - que trajava um figurino saído diretamente dos anos 80. Mas o que chamou a atenção foi a ternura com que ele conversava e tratava seu filho, um garoto de uns 12 anos. Comportamento de emocionar, no mínimo. Mas essa história fica para o futuro.

O Trensurb - realização do governo federal - passa longe de um metrô. Nunca é subterrâneo e poucas vezes é suspenso. Sai da Estação Mercado em Porto Alegre, às margens do Guaíba, e segue rumo a São Leopoldo.

Nos horários de pico, a gentileza gaúcha - já abordada aqui - dá lugar a afiados cotovelos procurando entrar antes para garantir lugares nos poucos assentos. Os trens, fabricados pela japonesa Hitachi, datam de 1984. Não dá pra dizer que não estejam conservados, mas aqueles vagões já viram dias melhores. O chá está bem gasto, mas a disposição dos bancos, longitudinais, e a presença de bagageiros que acomodam mochilas e bolsas, facilita a viagem.

Não desenvolvem uma velocidade de metrô, e o trajeto completo é feito em cerca de 45 minutos. E assim os vagões vão dançando ao lado do rio, depois beirando a rodovia por Canoas, Esteio e Sapucaia, as três cidades depois de Porto Alegre para quem segue até Novo Hamburgo.

Até aqui as estações são mais antigas. Mal conservadas e mal ilumidas, à noite, chegam a assustar. São também muito longas, demais para os quatro vagões da composição, fazendo com que as pontas sejam completamente despovoadas. Em São Leopoldo são mais novas e modernas.

Os passageiros em geral aparentam ser trabalhadores, velhos conhecidos de chão de frábrica e uns tantos estudantes, já que o trajeto inclui os arredores de uma porção de universidades. Chama a atenção a quantidade de gente lendo. Dan Brown, Paulo Coelho e outros descartáveis - e juro, está é uma constatação cheia de preconceito - passam diariamente por ali.

O predileto é o Diário Gaúcho - versão popular da Zero Hora e concorrente d'O Sul. Certa vez vi até um sujeito com as mãos sujas de graxa estudando as páginas de um livro de filosofia. No meu caso, Jonathan Coe e jazz moderno andam minimizando a monotonia da viagem.

Ainda assim é um dos meios de transporte mais eficientes que já vi. Pontualidade britânica nos trens e uma simpatia nada robotizada nos condutores, que usam roupas comuns, anunciam as próximas estações e desejam bom dia no início da viagem.

- Estação terminal São Leopoldo. Solicitamos que desembarquem. Tenham todos uma boa noite!

É aqui que eu fico.

terça-feira, 1 de maio de 2007

Não me chamem de senhor!

Podem chamar de arrogantes, separatistas, militaristas, saudosistas, bairristas e provincianos. O que for. Mas no trato geral e diário, os gaúchos estão entre as pessoas mais gentis que eu já conheci. Sim, existem verdadeiras legiões que endeusam Getúlio, Brizola, Simon (tanto o árbitro Carlos Eugênio, quanto o senador Pedro). Mas quando estão entre eles na rua, o comportamento é outro.

A primeira coisa que me chamou a atenção é a fila nos pontos de ônibus, aqui denominadas paradas. Não importa a hora, o movimento, a direção. A fila existe para ser seguida. Os cobradores e motoristas normalmente estão interessados em fazer com que você chegue ao seu destino em segurança e espantosamente dão boas indicações quando pede-se uma ajuda sobre qual a parada mais próxima de onde você quer ir. Bem diferente do grunhido inteligível que cansei de ouvir em SP.

Isso me leva a outra questão. Existe uma gama de coisas que sinto falta de São Paulo (e vamos abordá-la em breve). Mas não do transporte público. Principalmente do preço, da qualidade e da relação custo benefício. "Mas SP é infinitamente maior, mais difícil de ser administrada." É, mas o fato é que Porto Alegre talvez é uma das cinco ou seis maiores capitais brasileiras e tem um sistema de transporte público realmente eficiente, e relativamente barato.

O telemarketing é outra coisa da qual não sinto falta. Até me mudar pra cá, fazia tempo que não ligava pra uma pizzaria e falava com uma pessoa e não com um robô que tinha dificuldades em entender que realmente não era necessário me chamar de "senhor" e que não fica todo confuso quando, ao desligar, agradeço e desejo boa noite. Convenhamos, não é tão difícil falar: "Obrigado, pra ti também". E faz uma diferença danada.